Resenha: O Escravo de Capela - Marcos DeBrito

Título: O Escravo de Capela
Autor: Marcos DeBrito
Editora Faro
Páginas: 288
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Durante a cruel época escravocrata do Brasil Colônia, histórias aterrorizantes baseadas em crenças africanas e portuguesas deram origem a algumas das lendas mais populares de nosso folclore. Com o passar dos séculos, o horror de mitos assustadores foi sendo substituído por versões mais brandas. Em O Escravo de Capela, uma de nossas fábulas foi recriada desde a origem. Partindo de registros históricos para reconstruir sua mitologia de forma adulta, o autor criou uma narrativa tenebrosa de vingança com elementos mais reais e perversos.Aqui, o capuz avermelhado, sua marca mais conhecida, é deixado de lado para que o rosto de um escravo-cadáver seja encoberto pelo sudário ensanguentado de sua morte.Uma obra para reencontrar o medo perdido da lenda original e ver ressurgir um mito nacional de forma mais assustadora, em uma trama mórbida repleta de surpresas e reviravoltas.




"— Escravo aqui só tem direito a duas coisas — continuou: — Primeiro: não ter direito a nada E segundo: não reclamar desse direito. Se tem negro que discorda, para quem ainda não sabe, domesticar os selvagens é a função pela qual eu tenho mais apreço."

O Escravo da Capela se passa na época escravocrata do Brasil Colônia, no final do século 18. A história tem como cenário a Fazenda capela e seu canavial. Nesse cenário vamos conhecer a família Cunha Vasconcelos e alguns escravos dessa fazenda. A família é composta pelo pai - grão senhor - Antonio Batista, o filho mais velho e capataz Antonio Batista Segunda, um homem sádico e sem um pingo de amor, e o filho mais novo Inácio, recém chegado da Europa e formado em medicina, com uma ideologia totalmente diferente da sua família.

Antonio Batista Segundo é um homem perverso e totalmente sádico, ele não tem um pingo de piedade pelos escravos. E é nesse infeliz cenário de dor e crueldade que conhecemos o escravo Sabola.

Sabola é novato e não fala a língua portuguesa, logo que chega na fazenda ele sente muita raiva pelo tratamento que recebe e pelos castigos recebidos, gerando uma grande amargura e rebeldia. E no meio desse sentimento de revolta Akili um senhor que foi incapacitado de andar após um dos castigos nele infligido, e no meio de todo esse sofrimento uma cumplicidade entre eles acaba surgindo.

Já Inácio é aquele que tem um pensamento "pra frente" e já acredita no fim da escravidão, debatendo inclusive algumas vezes a forma que ele trata os escravos e o pai apoia. Ele acabou de chegar mas se sente fora do lugar, como se essa fazenda não fosse o lugar certo pra ele, mas em meio tanto desconforto ele acaba se apaixonando por uma escrava, a Damiana, e com isso também um amor proibido na época.
"As pás foram movidas e o defunto desmembrado começou a ser enterrado sem sequer terem lhe retirado o saco encharcado de sangue da cabeça. Apenas a boca escancarada, que insistentemente buscara o ar nos seus últimos suspiros, estava descoberta e não foi poupada de ser alimentada com a terra que o encobria."
O autor nos mostra em cada detalhe e em cada sentimento descrito a forma sem dó nem piedade como os escravos eram tratados, as chicotadas, os castigos, e inclusive a religião que eles eram obrigados a seguir. Além de mostrar a humilhação e sofrimento em cada abuso das mulheres que vivem somente pra servir os homens da casa. Eu não sei expressar exatamente o que senti, mesmo sentindo a tristeza em cada página eu fiquei feliz, pois o autor não teve meias palavras e colocou no papel alguns dos detalhes de todo sofrimento dos escravos na época.
"Sonhar ainda é uma das poucas coisas que os brancos não tiraram da gente."
E no meio de toda essa trama algo acontece, e é onde o autor vai introduzir a lenda do Saci Pererê. Nesse momento queria soltar vários palavrões para descrever, mas vou dizer que foi FANTÁSTICO! Eu amei a forma, onde o Saci não é um garoto levado, mas ele está ali em busca de vingança e justiça. E no meio disso tudo além de ter sangue escorrendo pelas páginas, os segredos mais sórdidos serão revelados.



O autor Marcos DeBrito não poupou detalhes nesse livro, com uma história contada em terceira pessoa vamos ver o lados de todos da história. A forma que foi escrita o livro parecia inclusive um enredo de filme, onde consegue te deixar preso em todos os momentos para não perder nada e tentar desvendar os segredos de todos. A edição da Faro é um caso a parte com "sangue" em cada página representando exatamente o que vai ter no livro.
"Um animal aprisionado em correntes, quando livre das amarras, naturalmente busca a fuga. No entanto, a oportunidade de retaliação, pelos anos de sofridos no cárcere não é desperdiçada quando fica de frente ao seu aprisionador."
Acredito que essa seja primeira resenha de um livro de terror no blog, mas saibam que ainda virão várias. Porque além de amar esse gênero, tenho visto muita coisa boa sendo publicada e acredito que o terror nacional está em boas mãos.

Acabei esse livro me perguntando como não tinha lido nada desse autor antes. Marcos DeBrito já possui outros dois livros publicados e o seu primeiro longa-metragem Condado Macabro lançado em 2015, e com certeza já quero ler outras obras dele.

Quando finalizei a história já estava imaginando qual seria a próxima lenda que o autor vai usar agora kkkkk. Um livro de terror, com a realidade da época da escravidão e um toque de folclore, um livro pra te deixar ligado em cada página e com o coração na mão em cada capítulo. O livro onde o terror e a tensão psicológica está em todos os momentos.








9 comentários:

  1. Boa tarde Raquel!parabéns pela resenha, é bom variar o gênero literário de vez em quando, como adoro terror com certeza vou ler o livro , engraçado tenho o mesmo sobrenome do personagens kkkk!é difícil para mim reconhecer esse período triste da nossa história, mas que bom que temos autores como o Marco que retratam esse tema de maneira tão verdadeira . que venham mais resenhas.

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  2. Oi Raquel,
    Não tenho costume de ler livros sobre escravidão, principalmente empregados em um contexto de terror, por isso O escravo da capela chamou minha atenção. Marcos DeBrito foi criativo ao inserir uma lenda brasileira em meio a verdades cruas e duras e, com certeza, isso conta muito a favor do enredo. É uma obra para nos fazer encarar a realidade brutal que faz parte da nossa história e assim que possível quero ter o prazer de conhece-la.

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  3. Raquel!
    Que o Marcos é um autor fenomenal, é inquestionável.
    E ver que soube usar o folclore local, junto com fatos realmente existentes e criar uma ficção espetacular e carregada de assombro, faz com que queira ler logo mais esse livro dele.
    “Conhecimento sem transformação não é sabedoria.” (Paulo Coelho)
    Cheirinhos
    Rudy
    TOP COMENTARISTA DE SETEMBRO 3 livros, 3 ganhadores, participem.

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  4. Oi, Raquel!!
    Adoro livros de terror e fiquei bem feliz de ver essa resenha aqui no blog!! Estou bem curiosa para saber como o autor utilizou o pano de fundo de uma época tão cruel que foi a escravidão no Brasil. E ainda fico me perguntando como ele o Saci, uma lenda folclórica do nosso país, nessa estória fantástica!!

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  5. oiii eu morro de medo de livros de terror kkkkk, mesmo gastando muito da resenha e da sinopse eu vou deixar esse livro passar, mas vou indicar para uma amiga que adora livros assim. bjusssss

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  6. Olá, tudo bem?
    Não costumo ler livros sobre escravidão, sinto que é um tema muito forte pra mim, pois sempre fico pensando como os ser humano pode ser tão sem coração só pela cor das pessoas. Mas gostei deste livro, aborda o gênero terror – o que eu amo-, e gostei da premissa e do enredo também. Acho que vou dar uma chance pra esse livro e ver no que vai dar.
    Adorei a resenha, beijos.

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  7. Oi Raquel.
    Quando eu li, também pensei no porque não tinha lido nada do autor antes, eu tinha uma visão muito pouco formada do que era a escravidão e esse livro abriu meus olhos de uma maneira muito triste, mas ainda assim construtiva, eu adorei a narrativa, a capa e como sempre sofre com os personagens,
    Bjs.

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  8. Olá Raquel!
    Bom, acho que irei sofre ao ler esse livro, tenho ele em minha estante mas não iniciei a leitura, eu queria saber mais sobre ele. Ao ler a resenha fiquei super impactada com a trama, vemos de uma maneira como era a escravidão daquela época e provavelmente não eram boas. Já estou ansiosa pela leitura!

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  9. Nossa que livro mais pesado ne? Tua resenha mesmo realista amenizou um pouco o quao agressivo pode ser esses contos, misturando realidade e criatividade. Fico super apreensiva e agitada com livros assim, mas pareceu ser interessante.Quem sabe...

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